quinta-feira, 26 de abril de 2012

Na companhia da solidão



Fala-se de solidão. Ela já foi cantada, declamada e narrada por um sem fim de artistas mas, fundamentalmente, é sentida e vivida em algum momento por nós, seres pensantes (e relacionais). Pode durar esse exacto momento, mas pode, também, durar uma vida inteira. Embora a noção de solidão tenha existido desde sempre (como condição intrínseca do ser humano), considera-se que há também uma vertente social que tem lugar neste “debate”. Assim, para compreender melhor a solidão, parece indispensável uma articulação entre a dimensão psicológica e essa dimensão social do conceito.

Entende-se que um dos rostos da modernidade é a valorização da autonomia individual. Ser auto-suficiente, ser independente, ser livre, são ideais que, na ausência de equilíbrio, conduziram à exacerbação do individualismo. Já na obra “A Cultura do Narcisismo” (1983), Christopher Lasch falou do modo como as sociedades capitalistas se estruturaram, material e simbolicamente, segunda essa preocupação intensa com a realização individual (estreitamente relacionada com o universo do consumo), em detrimento dos ideais colectivos. Ocorreu, gradualmente, uma centralização no Eu e um desinvestimento nas relações com os outros. Como dado significativo, recordemos que, consoante os países (do primeiro mundo), há estatísticas que situam entre os 25% e os 40% a percentagem de indivíduos que moram sozinhos.

Na verdade, muitos ainda não desistiram de tentar incluir no seu projecto de vida as ligações aos outros, mas vêem-se confrontados com relações interpessoais difíceis e complexas, sentindo-se frequentemente tentados/obrigados a recuar. Evidentemente, se inseridos numa sociedade esquecida de comportamentos de tolerância, que desvalorizou os afectos e as relações humanas, os indivíduos vivem em conflito permanente com o outro. E aí, acontece que o ser humano se sente de novo só, embora acompanhado. Fica uma pergunta: o “mal” estará realmente no outro, ou seremos todos nós também um produto da modernidade, acolhendo já inconscientemente essa incapacidade?

Sozinhos e sós, ou acompanhados e sós, são solidões distintas, que muitas vezes se fundem numa só, esmagadora. Se a solidão representa o sentimento quotidiano da nossa vida, talvez ajude verdadeiramente perceber, com ajuda técnica, qual a origem desse sentimento dentro de nós. E, em tempos de crise, talvez possamos recordar, por fim, que o afecto e as ligações humanas serão sempre os melhores ingredientes da felicidade.

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