quinta-feira, 26 de julho de 2012

Contos de Gente

Era uma vez. E depois foram felizes para sempre. É o começo e o fim de quase todos os contos infantis que povoam o imaginário das crianças. É inquestionável a importância dos contos de fadas: ajudam-nos a imaginar, a sonhar e a desejar. Ensinam-nos sobre o amor e sobre a amizade. Sobre os afectos. Sobre os valores. Ensinam-nos sobre a coragem e sobre a derrota e a vitória. São fundamentais, os contos de fadas. Mas o final é sempre feliz e nunca nenhum conto nos conta o que acontece depois do “felizes para sempre”. E se quando somos pequenos, acreditar nos desfechos felizes é o que nos permite andar para a frente, crescer é deixar cair a ilusão de que o fim das histórias é incondicionalmente feliz. Sem mais sobressaltos. Sem mais tropeções. As histórias são felizes enquanto puderem ser. Ora são mais felizes, ora são menos felizes, ora tornam a ser mais felizes. Crescer é encarar uma realidade que não é eternamente nem estaticamente cor-de-rosa mas podendo aceitar que há muitos outros tons que pintam as histórias das nossas vidas. São tons vermelhos, azuis, verdes, amarelos. Também há os cinzentos e mesmo os pretos. É, a realidade não é um conto de fadas. Mas é uma pintura colorida ainda mais interessante e saborosa do que um conto de fadas. São contos de gente.




“Muitos adultos ficam chocados com a violência dos contos de fadas e se surpreendem com o facto de que não a percebiam quando eram crianças, comprazendo-se nela. É que a maioria das crianças, além de aceitar naturalmente o maravilhoso, espera com inabalável certeza aquilo que o conto promete e sempre cumpre: "e foram felizes para sempre". A gente se engana, portanto, quando tenta "açucarar" os contos ou omitir as passagens "violentas".”

Marilena Chauí

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