quinta-feira, 31 de março de 2011

De corpo e alma


No século XVII, Descartes considerava que corpo e alma, embora diferentes e separados (dualismo cartesiano), se influenciam mutuamente (através da glândula pineal, dizia). Espinosa, afirmou que corpo e mente não são elementos distintos, como defendia Descartes, mas sim dois atributos diferentes da mesma substância (ou seja, corpo e mente são exactamente a mesma coisa vista de perspectivas diferentes).
Há, indiscutivelmente, um continuum entre corpo e mente. Como tal, muito frequentemente, algumas dores do corpo não são mais do que manifestações das dores da alma e esse fenómeno chama-se psicossomática. Conflitos que parecem impossíveis de ser mentalizados, expressam-se através do adoecer do corpo. Funciona como uma descarga agressiva do corpo sobre os órgãos (o sujeito não tem a capacidade de elaborar mentalmente os impulsos, nem sequer de os descarregar pelo comportamento sobre o exterior, no mundo, virando assim a agressividade contida contra si mesmo). De forma inconsciente, naturalmente.
Toda a doença psicossomática implica uma perspectiva holistica, operando num campo interdisciplinar que integra várias especialidades da medicina e da psicologia para estudar os efeitos de factores sociais, psicológicos e comportamentais sobre processos orgânicos e sobre o bem-estar das pessoas. A mente chega a todos os recantos do corpo. Destacam-se algumas patologias amplamente associadas a factores psicológicos, frequentemente encontradas em doentes psicossomáticos, como algumas doenças gastrointestinais (síndrome do cólon irritável; doença de Crohn; colite ulcerosa), doenças do foro respiratório (asma brônquica), doenças cardiovasculares, doenças endócrinas (diabetes); doenças dermatológicas (dermatite atópica; psoríase); doenças musculo-esqueléticas (fibromialgia; artrite reumatóide) e cefaleias (enxaqueca, cefaleias de tensão). Há ainda um artigo interessantíssimo que analisa as dimensões psicológicas do estrabismo e o contexto familiar das crianças estrábicas (Coimbra de Matos, 2003). Sobre o cancro, impera a necessidade de mais estudos.
Afirmar que uma dada doença num dado indivíduo é uma condição psicossomática não implica minimizá-la ou ignorá-la, pois as doenças são reais, não imaginadas. Na sua origem encontram-se factores psicológicos (em aliança com factores biológicos) mas a sua expressão é real e orgânica, o que implica um tratamento médico adequado, em paralelo a uma terapia que permita a expressão emocional do indivíduo sem ser através do seu corpo. Em Fernão Capelo Gaivota lemos, “Quebrem as correntes do pensamento e conseguirão quebrar as correntes do corpo”. Nem mais.

Referências úteis: Coimbra de Matos, A., (2003). Mais amor, menos doenças. Climepsi Editores.

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