quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Filhos ditadores, alunos violentos

"Por favor, baixa o volume. O pai está a tentar fazer os teus trabalhos de casa."

 
Assistimos, ao longo das últimas décadas, a uma alteração progressiva dos valores e da forma de funcionamento da sociedade portuguesa que conduziu, entre muitas outras coisas, à existência de um número cada vez maior de crianças que não encaram o adulto (pai, mãe, professor, educador) com o respeito de “antigamente”.
Por um lado, essa alteração trouxe uma maior proximidade, saudável, entre crianças e adultos, a nível das escolas e das famílias. Porque, por vezes, o respeito vestia a forma de medo e a excessiva distância imposta não era emocionalmente saudável. Por outro lado, o limite entre o saudável e o caótico está a tornar-se difuso. Surgem, agora, filhos ditadores e alunos violentos. Crianças cada vez mais impertinentes, desrespeitadoras, desobedientes e egoístas, em variados contextos. Crianças que, maioritariamente, cresceram com poucos limites e poucos nãos, no seio de famílias onde o tempo escasseia, onde o afecto é trocado pela matéria, onde a paciência para educar nem sempre abunda..!
A situação explica-se segundo vários factores, mas falemos da culpa que cabe aos pais. Nesta época de apogeu dos direitos das crianças, parece que nasceu o medo (ou a preguiça) de as contrariar. Mas criar uma criança tentando não a contrariar e agradar-lhe sistematicamente, mesmo quando não é aconselhável, rapidamente se revela um erro estratégico. Infelizmente, sabemos que uma criança que não sabe elaborar a sua frustração dificilmente poderá estruturar-se de forma saudável, originando, pelo contrário, meninos/adultos birrentos e caprichosos. Os limites ensinam a criança a reagir à frustração. Desde cedo, saber ouvir não, saber que há coisas que se podem fazer e outras não, saber que há permissões e proibições e ser capaz de crescer com isso torna as crianças emocionalmente saudáveis e disciplinadas. Para lá dos limites, há a questão dos bens materiais. Nas casas, os brinquedos abundam, mas a criança brinca sozinha. E nem vale a pena, porque os melhores brinquedos da criança serão sempre os seus pais, como afirma Eduardo Sá. Há também a questão das fronteiras familiares. Nas famílias, estas fronteiras nem sempre são bem definidas e os papéis hierárquicos aparecem por vezes trocados, com filhos a mandar calar os pais ou a gritar com eles.
É preciso recuperar alguns valores pedagógicos perdidos no tempo. Penso em mim, nascida no seio da chamada geração rasca, prevejo para esta mais recente “fornada” uma alcunha bem mais negra do que aquela atribuída, em tempos, à minha geração.

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