domingo, 13 de fevereiro de 2011

Os desafios da meia-idade



No desenvolvimento humano, todas as etapas do ciclo de vida implicam desafios específicos. Como tal, não só durante a infância e adolescência se processam grandes movimentos e consequentes mudanças. Também ao atingir a meia-idade surgem grandes e novos desafios. A percepção do envelhecimento, a relação conjugal revisitada, os filhos tornados adultos e a competição com pessoas mais jovens no mercado do trabalho podem conduzir à chamada “crise da meia-idade”. Assim, como em todas as restantes etapas da vida, o bem-estar psicológico está em muito ligado à capacidade de enfrentar e resolver com sucesso esses mesmos desafios.
O primeiro desafio, aceitar o envelhecimento do corpo. Por norma, esta tarefa de aceitação tem mais impacto no ser feminino (fomentada pelo peso do estigma social da perfeição do corpo feminino e boicotada pelas transformações associadas à realidade da menopausa). No homem, o envelhecimento do corpo é encarado de forma mais tolerante mas impõe-se igualmente uma dolorosa consciencialização do mesmo nos casos em que se possa associar ao declínio do funcionamento sexual. Esta aceitação implica a consciência de que o corpo não volta a ser o que foi um dia, percebendo, porém, que o corpo é apenas uma pequena parte do nosso ser e que, por isso, vale o que vale. Quanto ao declínio do funcionamento sexual, na maioria dos casos o problema é de origem ansiosa, muito mais do que fisiológica. E no fundo, quanto maior a pressão para nos mantermos excessivamente jovens, maior tristeza e maior irritabilidade sentiremos e mais dificilmente o seremos.
O segundo desafio, lidar com a limitação do tempo e com a ideia de morte. Embora estas questões possam surgir muito mais cedo em certas pessoas, nesta etapa da vida é mais vulgar que apareçam alguns receios mais prementes relativos ao tempo que nos resta, bem como algumas angústias associadas a uma maior proximidade do momento da morte. Porém, seremos tão mais livres disso quanto mais realizados nos sentirmos com a nossa vida  presente, bem como com aquilo que construímos até à data. Seremos ainda mais livres disso se os nossos dias forem bem vividos e se nos sentirmos amados e úteis. 
O terceiro desafio, manter/aprofundar a intimidade. Chegado o momento de autonomização dos filhos por excelência, impera um novo olhar sobre a vida conjugal. De facto, os maiores índices de divórcio acontecem nesta fase, pois após tantos anos a olhar pelos descendentes e a cuidar dos objectivos familiares nem sempre os casais conseguem ir olhando um para o outro da forma mais adequada. E por fim, quando marido e mulher se olham novamente a sós, sem a presença de um terceiro, encontram tantas vezes um certo (ou mesmo enorme) desconforto. Obrigados a conviver sem mediação, muitas vezes desistem da aventura da redescoberta do outro antes de sequer tentar, e logo no preciso momento em que recuperam a intimidade perdida ao longo dos anos.
O quarto desafio, transformar a relação com os filhos. O desafio da parentalidade está em constante transformação. De miúdos a graúdos, as exigência dos filhos para com os pais (e vice-versa) está sempre em transformação. Esta transformação não deve acontecer com nostalgia, mas sim com agrado, energia e positivismo perante um acontecimento natural do ciclo de vida. Se os filhos estão a crescer, é porque fomos bons pais. E assim torna-se fundamental aprender a ler nas entrelinhas o que os filhos pedem de nós, quais são as suas reais necessidades, para nos ajustarmos a elas com bom senso.
O quinto desafio, actualizar-se profissionalmente. Perceber que é fabuloso poder aliar a sabedoria e experiência da idade a todas as ferramentas de renovação de conhecimentos que hoje temos ao nosso dispor. Por mais que os jovens, sem dúvida, mereçam oportunidades, na meia-idade ainda há trabalho a fazer. A reforma vem mais tarde.
O sexto desafio, tornar-se avô/avó. Consequência mais ou menos directa do quarto desafio, há que descobrir os prazeres de poder mimar sem tanta pressão para educar (ou educando sem ansiedade, pelo menos) e de poder acrescentar um novo papel à nossa vida, que nos proporcionará descobertas maravilhosas, até sobre nós próprios.  
O sétimo desafio, cuidar dos mais velhos, os pais dos pais. Há frequentemente uma geração anterior que precisa de ternura e cuidado. Nem sempre é fácil inverter os papéis. Em caso de doença, falamos de um apoio muito exigente e desgastante.
Verifica-se que a meia-idade é um período fértil na procura de aconselhamento ou de uma psicoterapia. Poder contar com ajuda para se redescobrir, para reinvestir no casamento ou mesmo para ganhar coragem para mudar tudo é uma atitude de cuidado e responsabilidade. Sem nunca esquecer que provavelmente esta será a fase mais adequada para usufruir de alguma qualidade de vida e para se permitir investir na felicidade com mais serenidade e sabedoria (se muito já passou, muito ainda virá!).

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