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terça-feira, 8 de abril de 2014

Nem tanto ao mar nem tanto à terra



Ainda hoje muitos estudiosos se questionam acerca da origem da agressividade: será inata (um instinto ou pulsão) ou adquirida (por frustração ou trauma)? Por outras palavras, será genética e constitucional ou será resultado de experiências muito precoces? O que é inquestionável é que a incidência da agressividade nos seres humanos varia amplamente de indivíduo para indivíduo.
Sabemos desde muito cedo demonstrar o nosso desagrado. Pedir e reclamar são acções que exigem um “mínimo” de agressividade. A criança pode demonstrar assim algumas reacções de raiva quando não obtém o que pretende (gritos, choro, agitação, morder) pois a raiva é o afecto básico subjacente à agressividade. Estas reacções directamente agressivas vão normalmente cessando à medida que a criança é capaz de se exprimir pela linguagem. Recorrendo às palavras, podemos expressar as emoções sem ter como único recurso a explosão corporal, na forma de gritos e agitação motora, sendo estes, recursos mais primários.
Contudo, algumas crianças continuam a manifestar-se mais explosivas, agredindo colegas, adultos, ou partindo coisas. São crianças ditas impulsivas que, face à mínima contrariedade, se enfurecem violentamente. Por vezes, esta atitude é selectiva, acontecendo apenas com uma determinada pessoa, geralmente com adultos incapazes de acolher, conter e dar significado à zanga, tudo isto, de forma madura e adequada. Não se responde a uma birra com outra birra. Por outro lado, este tipo de zanga que mora à flor da pele, geralmente remete para duas situações opostas: ou frustração a mais, ou frustração a menos. Ou seja, ou há muita falta de afecto e disponibilidade para a criança ou, por vezes, demasiada permissividade, reforçando a omnipotência típica das crianças pela incapacidade de se lhes colocar os "tão falados" limites (pouca assertividade e dificuldade em dizer não)  muitas vezes já por receio de uma reacção “complicada”. É importante a existência de uma figura de autoridade. Tradicionalmente, este papel é desempenhado pelo pai que, simbolicamente, representa a “lei” mas, muitas vezes, pode ser a mãe capaz de desempenhar igualmente bem a função. Ou seja, na estruturação psicológica das crianças, terá que haver pelo menos uma figura parental que introduza e represente as normas (com algum acordo da outra figura parental), bem como a gradual aceitação das frustrações e contrariedades inerentes ao viver. Percebe-se que este comportamento também se encontra com frequência em famílias onde o entendimento entre os pais (ou figuras cuidadoras) é frágil ou artificial.
Em escalada e não percebida, esta zanga permanente ou "também chamada" intolerância à frustração (seja por falta ou excesso dela) adquire, em algumas crianças, proporções inquietantes, culminando por vezes em comportamentos de risco na chegada à adolescência: destruição de objectos, ameaças permanentes, fugas de casa, etc.

É de realçar que do outro lado da moeda há a problemática da inibição grave da agressividade. Quando encontramos uma criança que evita por completo qualquer situação de carácter agressivo, não protestando e nunca se enfurecendo, é momento de questionar. Crianças vulgarmente submissas e aparentemente muito ajuizadas estarão provavelmente a reprimir as suas emoções mais agressivas, o que não é facilitador de um desenvolvimento saudável e equilibrado. Desde a leve inibição à total incapacidade em defender-se, o “lugar da vítima” começa a definir-se cedo, podendo evoluir para modalidades de funcionamento relacional em que aceitar tudo o que acontece sem nunca se zangar, reclamar ou reivindicar, se torna um padrão de relação com os outros, originando sofrimento psicológico.

domingo, 22 de setembro de 2013

Pedrinha (Do dizer que não)

(…) E é do NÃO ao que te limita e degrada que tu hás-de construir o SIM da tua dignidade. 

Virgílio Ferreira


terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Culpas e desculpas



A culpa é um sentimento ligado ao sentido de responsabilidade e à reflexão sobre as consequências dos nossos actos. Para lá da sua definição mais básica, a culpa é um sentimento complexo. É complexo porque existe a culpa dita normal, lógica, mas também uma culpa que pode ser ilógica, logo, patológica. Este último sentimento de culpa implica assumir uma culpa que não nos “pertence”, traduzindo-se num estado constante de angústia e sistemática desvalorização de si mesmo. É deixar-se culpar facilmente pelo outro em situações em que não é suposto, ou mesmo pedir desculpa ainda antes de sermos anunciados culpados. Deve dizer-se que estes fenómenos se passam de forma mais ou menos inconsciente, ou seja, sem alguém que nos ajude a pensar os nossos pensamentos não temos bem noção do que fazemos com os nossos sentimentos de culpa.
Culturalmente, durante muito tempo os indivíduos viveram em sociedades limitadas pela culpa, onde muito era reprimido e pouco era permitido. A culpabilidade é a uma belíssima forma de dominar o outro e o sentimento de culpa é um severo carrasco. Uma pessoa dominada pela culpa fica amarrada ao outro e presa dentro de si mesma. Neste contexto, há mais de cem anos atrás, Freud descreveu o sentimento de culpa como o mais importante problema no desenvolvimento da civilização desse tempo. Os seus pacientes sofriam sobretudo de patologias associadas à grande culpabilidade que sentiam. Reprimidos, não se permitiam ser autênticos, não se permitiam a pensar pela sua cabeça nem a viver os seus afectos. O ser humano tinha muito pouca liberdade de “ser”.
Aos poucos, ao longo do séc. XX, as sociedades foram mudando e a culpa foi abandonando o seu papel tão castrante no desenvolvimento do ser humano. Nesta linha, Jacques Lacan, psicanalista francês do séc. XX, dizia que, em última instância, a única coisa de que podemos realmente sentir-nos culpados é de abrir mão dos nossos desejos. E assim foi. Sedentos de liberdade, fomos dando azo às nossas vontades, cada vez com maior confiança e assertividade. Teremos caído no outro extremo? Hoje, séc. XXI, fala-se muito da falta de limites nos indivíduos (principalmente a propósito das crianças e dos adolescentes). Eventualmente mas não generalizando, há casos de exageros, mas para não cairmos em tentação de voltar aos “regimes” da culpa, queremos escolher um caminho mais adequado. Uma consciência social, relacional, parental, e individual, com a responsabilidade inerente ao bom desenvolvimento psicológico de cada um. Os limites não são impostos só porque sim, é a realidade per si que nos continua a colocar os limites. Seremos sempre movidos pela procura do prazer e da realização individual, mas embatemos todos os dias nas interdições colocadas pela realidade. Esta é, inevitavelmente, a condição humana.