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quarta-feira, 15 de outubro de 2014

A Droga da Obediência


Em todo o mundo, pelo menos cerca de dez milhões de crianças devem receber a prescrição para tomar comprimidos à base de metilfenidato, uma substância química que actua como estimulante leve do sistema nervoso central, elevando o seu nível de alerta, como uma espécie de anfetamina. O fármaco incrementa os mecanismos excitatórios do cérebro, o que resulta numa maior concentração, coordenação motora e controle dos impulsos. Tudo isto acontece por causa de um bicho-papão chamado Perturbação de Hiperactividade com Défice de Atenção (PHDA), vulgarmente designada pelo seu nome do meio, hiperactividade.
Reza a história que as crianças com PHDA apresentam um padrão comportamental caracterizado, essencialmente, por um persistente défice de atenção, excesso de agitação motora e, eventualmente, presença de impulsividade. A hiperactividade está nas bocas do mundo. É fácil perceber porquê, já que o “diagnóstico” de hiperactividade é um rótulo altamente maleável e sobretudo conveniente, encaixando como uma luva nas crianças de hoje. Em boa verdade, parece que dá jeito esquecer que, em primeiro lugar, as crianças são naturalmente agitadas e impulsivas, em segundo lugar, que são por vezes pouco regradas ou mesmo mal-educadas e, em terceiro lugar, que normalmente a agitação motora e incapacidade de concentração são um sintoma de algum mal-estar psicológico que exige uma leitura do que está por detrás.
Assim, para professores e famílias em pânico e sem tempo para auscultar os sintomas do corpo, existe o metilfenidato. Os médicos alinham e a indústria farmacêutica agradece. Mas o efeito do metilfenidato nas pessoas está longe de ser completamente pesquisado e nada se sabe sobre suas consequências a longo prazo. Contudo, é receitado precisamente a crianças pequenas e, frequentemente, ao longo de vários anos. O mais curioso é que poucos parecem importar-se com a constatação óbvia de que a dita “doença” não é curada através do uso de medicação, mas apenas mascarada. O que importa é as crianças não maçarem muito no momento presente e aprenderem tudo o mais rápido possível, independentemente de "gritarem" por todos os lados que não estão capazes para aprender. E assim que a aplicação do medicamento é suspensa, os sintomas reaparecem imediatamente, e muitas vezes até surgem novos sintomas, mais graves.

Hoje, muitos cientistas, psiquiatras e neurobiólogos já assumem que o uso do metilfenidato foi vantajoso para muita gente, pois existindo uma PHDA, não se responsabiliza quem quer que seja e retira-se um peso aos pais, educadores e professores. Como profundo reflexo dos tempos modernos, se algo não funciona bem, ingere-se um comprimido. Transformou-se em patologia aquilo que remete, no fundo, para questões familiares e culturais. Ao medicarmos os sintomas, excluímo-nos da responsabilidade diante dos novos desafios na educação das nossas crianças. Escutar e observar o que cada criança quer dizer, através de um comportamento tido como desajustado, será o único caminho para não silenciar os conflitos inerentes à construção da vida. 

sexta-feira, 22 de agosto de 2014

Respirar


Não somos máquinas, somos pessoas. É importante poder respirar. Entre tarefas, entre assuntos, entre relações. Num mundo que bate palmas àqueles que vivem em "modo TGV" (que vivem um dia com 24h como se ele tivesse 36h) é difícil fazer crescer esta ideia, mas que fique a semente, pois em solo fértil, germinará. 

sábado, 4 de dezembro de 2010

Os Tom Sawyers



Fala-se muito de hiperactividade. É uma perturbação do comportamento, de origem neurológica (mas com contornos difusos) que interfere com a vida familiar, escolar e social de um elevado número de crianças. Contudo, a hiperactividade passou também a representar um belíssimo bode expiatório no caso de muitas crianças enérgicas e agitadas ou simplesmente malcomportadas. Falemos da criança hiperactiva, mas não dessa criança convenientemente designada hiperactiva porque se mexe demais, fala demais e incomoda demais. Falemos, sim, da criança que vive a realidade da Perturbação de Hiperactividade com Défice de Atenção.
É uma perturbação que se reflecte essencialmente em comportamentos que poderiam ser encarados como normais numa criança se não fosse o exagero na sua frequência, intensidade e inoportunidade. Primeiramente, caracteriza-se pela dificuldade em manter a ATENÇÃO durante muito tempo. Há uma extrema dificuldade em atingir a concentração necessária para realizar determinadas tarefas, escolares ou quotidianas, assim como um nível de empenho muito baixo. Como tal, as tarefas a que se propõe raramente são concluídas. Segue-se a IMPULSIVIDADE manifestada no agir sem pensar nas consequências. Depois, também, a HIPERACTIVIDADE propriamente dita, ou seja, o excesso de actividade motora e incapacidade de estar quieta em qualquer circunstância. Consequentemente, surgem as DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM, que decorrem naturalmente da difícil manutenção da atenção e da inquietação motora. DESOBEDIÊNCIA, pois para além da sua impulsividade estas crianças lidam ainda muito mal com a frustração e com a contrariedade. Por fim, a LABILIDADE EMOCIONAL (variações bruscas no humor). No fundo, vemos uma criança que representa, metaforicamente, uma espécie de furacão.
Uma criança hiperactiva origina grande instabilidade familiar, não só pelos comportamentos no seio da sua família, mas também porque socialmente coloca em cheque as capacidades educativas e pedagógicas dos pais, que se sentem frequentemente incapazes de conter ou dominar o seu filho e vivem sistematicamente sob a dura e ignorante crítica alheia.
Os fármacos, embora mal-amados, são essenciais para o controlo da impulsividade e da atenção. Posto isso, o acompanhamento psicológico será outro componente essencial na ajuda da criança e da sua família na gestão da problemática. 

Referência: Polaino-Lorente, A. & Ávila, C. (2004). Como viver com uma criança hiperactiva. Edições ASA.