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domingo, 8 de novembro de 2015

Do que aprendi


Aprendi com tudo isso que aprende mais rápido quem sabe olhar em diferentes direcções e adopta novos ângulos de visão; aprende mais rápido quem escuta o outro, quem se dispõe a abandonar os seus desejos ou crenças para criar espaço; aprende mais rápido quem é humilde e também quem aceita sem oferecer excessiva resistência; aprende mais rápido quem não tem medo de dobrar ou de cair e quem se ri de si mesmo quando tal acontece; aprende mais rápido quem não se deixa apanhar pela vergonha de falhar, de fazer mal feito; aprende mais rápido quem se expõe, porque se arrisca; aprende mais rápido quem se desapega da prepotência de querer aquilo naquele momento e daquela maneira: às vezes não dá. Aprende mais rápido quem tenta distinguir o possível do impossível. Ou seja, aprende mais rápido quem respeita a realidade enquanto ser gigante que não se verga e por isso aceita a impotência de viver nela e com ela. Aprende mais rápido quem não perde mais que o tempo suficiente a lamentar-se ou a enraivecer-se com isso. Aprende mais rápido que tem essa capacidade de ajustamento e/ou adaptação. Porém, aprende mais rápido quem se permite sair da harmonia da adaptação quando surgem perguntas e se impõe um outro entendimento. De resto, e enquanto isto, aprende sempre mais rápido quem intui que o tempo também tem o seu papel e escolhe avançar — à distância entendem-se melhor as coisas.

quarta-feira, 26 de agosto de 2015

Da necessidade ao desejo


Há coisas que precisamos e das quais dependemos (necessidades) e coisas que queremos porque assim escolhemos (desejos). A necessidade diz respeito a algo muito básico, mais primário na nossa condição humana. Fala-nos de algo que nem se sabe bem porque acontece: só se sabe que se precisa e que é assim, queira-se ou não se queira. Assim, quando a necessidade não é satisfeita, permanece, sob a forma de uma falha básica dentro de nós. Já o desejo é de outra ordem. O desejo é secundário, na medida em que chega depois. Pressupõe algo que não é absolutamente fundamental mas que representa um valor acrescentado à nossa vida. É algo que foi pensado, sonhado, de forma mais consciente, e que não nos é imposto de dentro.
De uma forma geral, o caminho do desenvolvimento humano faz-se evoluindo da necessidade para o desejo. Enquanto bebés, temos muitas necessidades, mas não desejos, no sentido referido de escolhas pensadas, conscientes. Chegamos a “seres desejantes” à medida que crescemos e se existiu possibilidade de atender suficientemente às necessidades. Caso contrário, ficamos bloqueados ou suspensos na carência primária, que tornará a busca dessa satisfação uma prioridade para nós. O caminho de amadurecimento do Eu não acontece se há privação nas necessidades mais fundamentais.
Então a necessidade coloca-nos no campo das dependências, enquanto o desejo nos fala de escolhas livres. Eu só desejo quando já não preciso, até lá, necessito e dependo disso, tantas vezes, para minha sobrevivência. Há uma fome daquilo que me falta que ainda me esmaga. E enquanto assim for, estou no campo da necessidade, aquém do desejo. Se nunca recebi afecto, estou imerso na sua carência e ele representa, naturalmente, uma busca incessante. Mas se recebi afecto suficiente, consigo aguentar melhor a sua eventual ausência, passando de uma questão de sobrevivência a um desejo que está por realizar.
Assim, no amor romântico, a diferença entre "preciso de ti" e "quero-te" é uma diferença que corresponde aos quilómetros de amadurecimento que vão da necessidade ao desejo. É poético dizer a alguém "preciso de ti". A mistura entre necessidade e desejo, característica na paixão, alimenta as artes desde sempre, apresentando o amor romântico como uma coisa quase visceral. Mas o amor homem-mulher, amor erótico de seu nome, corresponde, em maior escala, a um desejo e não a uma necessidade. Eu estou contigo não porque preciso de ti mas sim porque te quero. Porque te escolhi. Não morro se fores embora mas sou muito mais feliz contigo.

segunda-feira, 13 de abril de 2015

Matemática dos Beijos


— Um, dois, três, duzentos e cinquenta e sete, cinco mil setecentos e quarenta e nove: quantos beijos cabem na vida?
— Talvez quarenta milhões? (sorriso) Não sei. Curtos ou longos? Tudo depende da duração. Num dia cabem mil quatrocentos e quarenta beijos de um minuto ou um beijo de mil quatrocentos e quarenta minutos. Tu é que escolhes.
— Tens razão. Isso da duração importa. Fizeste-me lembrar também daqueles beijos que ficam connosco já depois de se irem, sabes? E às vezes até se cruzam com outros que hão-de vir: "Olá, ainda por aqui?".
— É, há beijos que se demoram e acho até que alguns nunca acabam. Mas a memória de um beijo vale por um beijo, não?
— Olha que não sei. Cada beijo lembrado pode contar como um novo beijo. Podemos escolher também aqui.
— Hum. E incluindo beijos de que tipo?
— De todos. Dos beijos dados, dos beijos roubados, dos beijos perdidos e dos achados. Dos beijos que procuram e dos beijos que encontram. Dos que fracturam e dos que reparam. Dos que rompem e dos que ligam. Dos beijos que acordam, dos que adormecem. Dos que se encontram à esquina e dos que chocam de frente. Dos de passarinho e dos de corpo inteiro. Dos enternecidos e dos apaixonados. Dos que nos esclarecem e dos que nos confundem. Dos que quase enlouquecem, no bom sentido. Beijo é sempre no bom sentido. Dos beijos que acalmam e dos que assustam. Dos que respiram e dos que sufocam. Dos beijos que nos dissolvem, sabes? Dos beijos-buracos-negros que acabam com a gravidade e nos sugam em espiral para lá do tempo e do espaço. Dos beijos que desaparecem. E dos que nos perseguem. Perseguem. Perseguem. Perseguem.
— Mas queres fazer contas ou escrever um poema?
— Pois se calhar a matemática não se aplica a isto. Teríamos ainda a questão dos beijos sonhados.
— Também querias ir por aí?!
— Claro. Quero ir por todos os lados.
— (sorriso)
— ah! E o beijo dos beijos. Teríamos que contar com o beijo dos beijos.
— Qual?
— Tu sabes. É aquele que não se pode lembrar...
— O que há-de vir?
— Pois. Também não custaria nada. É só somar um no fim.
— (sorriso) Qual fim? Contigo será impossível contabilizar beijos.
— Se calhar. Que se lixem as contas. O que importa é que é sempre a somar. E para que não haja desperdícios lembra-te disto que é importante: um beijo que não se dá é um beijo que não se deu.