quinta-feira, 14 de março de 2013

Existir


Para encontrar a saída siga as indicações.

Pedrinha (Do Tactear)


“É mesmo essencial, para o seu equilíbrio psíquico e para a salutar expansão  da sua personalidade, que o adolescente possa tactear ou encetar vários caminhos antes de verdadeiramente escolher o que melhor corresponde à sua maneira de ser, de sentir o mundo e de perspectivar o futuro. Não lho permitir será amputá-lo para todo o sempre nas suas potencialidades evolutivas.”

António Coimbra de Matos

Sobre outras perspectivas



"What if I should fall right through the center of the earth... Oh, and come out the other side, where people walk upside down? "

 Lewis Carroll in Alice in Wonderland

domingo, 3 de março de 2013

Viver ou Sobreviver?



Nascemos. Num determinado lugar e numa certa família, que não escolhemos. Dão-nos um nome, que também não escolhemos, mas somos donos de um corpo e de uma alma. A nossa alma (ou mente ou psique) permite-nos pensar e sentir, e esse corpo permite-nos concretizar coisas. Chegados aqui, o que fazemos com isso? Que faço eu da minha vida e que pretendo ainda fazer? Dar um sentido à vida é algo que vive na mente de alguns mas não na mente de todos. Perspectivar o passado e planear o futuro, sabendo de onde viemos mas olhando principalmente para onde nos dirigimos é atribuir significado à nossa existência. E é fundamental. O sentido da vida diverge de pessoa para pessoa, de dia para dia e, por vezes, de hora para hora, pois o que interessa, sobretudo, não é um objectivo geral, único e rígido, mas o significado específico que vamos atribuindo ao longo do tempo e dos acontecimentos e que, naturalmente, se modifica e adapta em função do nosso desenvolvimento pessoal.
Em meados do século passado já tínhamos compreendido que os indivíduos que melhor sobreviveram aos campos de concentração durante a II Guerra Mundial (os que ficaram menos debilitados física e psicologicamente) foram maioritariamente aqueles que se agarraram a uma razão para sobreviver e mantiveram em mente uma motivação forte para o conseguirem. Mais recentemente, investigação médica descobriu que um forte sentido de existência (e o bem-estar subjacente a esse sentimento) se correlaciona com uma melhor saúde física e longevidade. E, por fim, chegou-se à Saúde Mental: aqueles que desenvolvem objectivos para a sua vida e que se empenham e comprometem na sua concretização tornam-se pessoas mais felizes e saudáveis. Dar sentido à nossa vida protege-nos da depressão, da ansiedade e mesmo da deterioração cognitiva. Novas evidências científicas sugerem ainda que é uma capacidade essencial para atenuar os sintomas de doenças degenerativas como o Alzheimer, num estudo que tem permitido concluir que aqueles que em vida atribuem mais significado à sua existência e mantêm presente os seus propósitos estão mais protegidos contra este mal.
São aqueles que não se limitam a viver um dia de cada vez sem pensar no futuro, são os que se sentem bem com o que fizeram da sua vida e com o que planeiam fazer futuramente, aplicando-se na concretização dos sonhos, e ainda os que não desistiram desses objectivos com o passar no tempo nem mesmo perante as adversidades. O vazio existencial é uma morte lenta. Sonhar com esperança, planear com entusiamo, concretizar com perseverança. Viver, e nunca apenas sobreviver. 

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

Certeza da Incerteza



Em todos os manicómios há doidos malucos com tantas certezas!
Eu, que não tenho nenhuma certeza, sou mais certo ou menos certo?

Fernando Pessoa, Tabacaria

terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Culpas e desculpas



A culpa é um sentimento ligado ao sentido de responsabilidade e à reflexão sobre as consequências dos nossos actos. Para lá da sua definição mais básica, a culpa é um sentimento complexo. É complexo porque existe a culpa dita normal, lógica, mas também uma culpa que pode ser ilógica, logo, patológica. Este último sentimento de culpa implica assumir uma culpa que não nos “pertence”, traduzindo-se num estado constante de angústia e sistemática desvalorização de si mesmo. É deixar-se culpar facilmente pelo outro em situações em que não é suposto, ou mesmo pedir desculpa ainda antes de sermos anunciados culpados. Deve dizer-se que estes fenómenos se passam de forma mais ou menos inconsciente, ou seja, sem alguém que nos ajude a pensar os nossos pensamentos não temos bem noção do que fazemos com os nossos sentimentos de culpa.
Culturalmente, durante muito tempo os indivíduos viveram em sociedades limitadas pela culpa, onde muito era reprimido e pouco era permitido. A culpabilidade é a uma belíssima forma de dominar o outro e o sentimento de culpa é um severo carrasco. Uma pessoa dominada pela culpa fica amarrada ao outro e presa dentro de si mesma. Neste contexto, há mais de cem anos atrás, Freud descreveu o sentimento de culpa como o mais importante problema no desenvolvimento da civilização desse tempo. Os seus pacientes sofriam sobretudo de patologias associadas à grande culpabilidade que sentiam. Reprimidos, não se permitiam ser autênticos, não se permitiam a pensar pela sua cabeça nem a viver os seus afectos. O ser humano tinha muito pouca liberdade de “ser”.
Aos poucos, ao longo do séc. XX, as sociedades foram mudando e a culpa foi abandonando o seu papel tão castrante no desenvolvimento do ser humano. Nesta linha, Jacques Lacan, psicanalista francês do séc. XX, dizia que, em última instância, a única coisa de que podemos realmente sentir-nos culpados é de abrir mão dos nossos desejos. E assim foi. Sedentos de liberdade, fomos dando azo às nossas vontades, cada vez com maior confiança e assertividade. Teremos caído no outro extremo? Hoje, séc. XXI, fala-se muito da falta de limites nos indivíduos (principalmente a propósito das crianças e dos adolescentes). Eventualmente mas não generalizando, há casos de exageros, mas para não cairmos em tentação de voltar aos “regimes” da culpa, queremos escolher um caminho mais adequado. Uma consciência social, relacional, parental, e individual, com a responsabilidade inerente ao bom desenvolvimento psicológico de cada um. Os limites não são impostos só porque sim, é a realidade per si que nos continua a colocar os limites. Seremos sempre movidos pela procura do prazer e da realização individual, mas embatemos todos os dias nas interdições colocadas pela realidade. Esta é, inevitavelmente, a condição humana.

sábado, 2 de fevereiro de 2013

Pedrinha (do Ler, Escrever e Contar)



A partir das minhas investigações sobre o comportamento evolutivo dos bebés, concluí que geneticamente convém chamar leitura ao que cada um observa à sua volta; escrita ao que se regista espontaneamente sobre coisas diversas; contar ao que se vive corporalmente como ordem e quantidade.

 João dos Santos 

Retrato de uma emoção qualquer


segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

Corpos que Falam o que a Cabeça não Pensa



O drama maior é que em muitas pessoas, e em particular nas crianças, a ansiedade e a tristeza se resolvem por doenças e por comportamentos.

João dos Santos (1980)

domingo, 13 de janeiro de 2013

Contos de Domingo


Corpo e Psique - Definhar e Florescer



"Os estados afectivos persistentes de natureza penosa, ou, como se costuma dizer, 'depressiva', tais como desgosto, a preocupação e a tristeza, abatem a nutrição do corpo como um todo, causam o embranquecimento dos cabelos, fazem a gordura desaparecer e provocam alterações patológicas nas paredes dos vasos sanguíneos. Inversamente, sob a influência de excitações mais alegres, da 'felicidade', vê-se o corpo inteiro desabrochar e a pessoa recuperar muitos sinais de juventude. Evidentemente, os grandes afectos têm muito a ver com a capacidade de resistência às doenças infecciosas; um bom exemplo disso é a observação médica de que a propensão a contrair tifo e disenteria é muito mais significativa nos membros de um exército derrotado do que na situação de vitória. Ademais, os afectos – embora quase que exclusivamente os depressivos – muitas vezes bastam por si mesmos para ocasionar doenças, tanto no tocante aos males do sistema nervoso com alterações anatómicas demonstráveis quanto no que concerne às doenças de outros órgãos." (Freud em "Tratamento Psíquico (ou Anímico)", 1905)

domingo, 6 de janeiro de 2013

Reflexão no Sapatinho (em Dia de Reis)



No Natal passado especulou-se sobre o que estaria para chegar. Continuamos aqui, ainda inteiros, e depois de um ano de dificuldades, penso que podemos pensar sobre o outro lado da moeda, que mostra que estamos humanamente mais “crescidos”. Arriscando dizer que somos hoje menos individualistas, já que nunca como agora houve tanta consciência social. Repare-se no aumento exponencial de movimentos solidários de recolha e distribuição de alimentos, brinquedos, vestuário, livros, e tudo o mais que possa faltar numa casa de família. E não só a nível institucional, mas atitudes solidárias em pequena escala, que nascem do coração de alguns.
Sabemos de famílias que este ano produziram, criativamente, os seus próprios enfeites de Natal, recorrendo a materiais caseiros ou recolhidos na rua, trabalhando afincadamente na exploração de tintas, papéis e tesouras. Tudo o que é feito com as nossas mãos tem cheiro a afectos e com um carinho especial se orgulham dos seus enfeites mais do que de qualquer outro adquirido anteriormente num balcão alheio.
Parece também que todos reduziram a sua lista de presentes, que não só incluía a “prima da vizinha” (tantas vezes só para parecer bem) como também incluía presentes de valor o mais elevado possível (como se o valor fosse espelho do afecto nutrido pelo outro). Hoje procuram-se presentes mais adequados e em quantidade mais adequada. Sobretudo, é o acto de compra impulsiva que perde força este Natal. Pensa-se mais antes de agir. Mais, muitos fazem este ano os seus próprios presentes ao invés de comprar e há ainda quem prefira aderir a iniciativas de pequenos comerciantes ou artesãos. Porque prosperam negócios caseiros, de elevada qualidade e preço acessível, nascidos da necessidade e da criatividade de gente cheia de talento que nunca deu oportunidade a si mesma de pôr mãos ao trabalho e deixar a imaginação voar. Trabalhos de bijuteria, de costura, de culinária, de pintura e experiências a tantos níveis. Artesãos dos tempos de crise que talvez encontrem aqui, este Natal, a semente de uma ideia que venha a germinar no futuro.
Em poucos meses, e embora quase por obrigatoriedade, caiu por terra a atitude excessivamente consumista e passiva que coloriu o Natal dos últimos anos. E, curiosamente, não deixamos de sentir um “espírito natalício” por aí, que agora parece vir mais de dentro para fora e não tanto de fora para dentro. Nem tudo o que nasce no seio de uma crise é necessariamente mau, e assim, começando com um Natal mais humano, quem sabe depois esta postura possa ir entrando devagarinho pelas nossas casas, ensinando-nos um equilíbrio social e económico que poderíamos estar quase a perder de vista. 

Bom ano!


Para ganhar um Ano Novo
que mereça este nome,
você, meu caro,
tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo novo,
eu sei que não é fácil,
mas tente, experimente, consciente.
É dentro de você
que o Ano Novo cochila
e espera desde sempre.

Carlos Drummond de Andrade