O
amor confunde-se. Confunde-se com tantas outras “coisas” sorrateiras. Ou
melhor, as pessoas confundem o amor. É que há amores que não são mais do que uma
ilusão desse sentimento, quando o que realmente sustenta a ligação são emoções
de uma outra natureza e qualidade. Chamamos-lhe amor porque não sabemos que nome
lhe dar. Chamamos-lhe amor, mas o engano não é por mal, somos guiados por
convicção profunda de que amor será.
Mas
em boa verdade não lhe posso chamar amor só porque me sinto tão especial ali, nesse
recanto da vida de alguém. Não lhe posso chamar amor apenas porque
quero/preciso ser amado quando no fim de contas amar pressupõe que, em primeiro
lugar, amor é o meu olhar sobre o outro (que não vive sempre necessariamente na
simetria do olhar que recai sobre mim). Não lhe posso chamar amor quando estou
ali apenas porque quero/preciso de não me sentir só e porque um colinho sabe bem.
Quando assim é, na demanda para colmatar uma falha original e respectiva fome
de afecto, percebemos que afinal qualquer tampa pode servir na nossa panela
desde que lá dentro fique quentinho e ferva. O amor será antes aquela única tampinha para a minha panela.
Também
não podemos chamar-lhe amor quando andamos desesperados a tentar transformar alguém
que “amamos” para nosso gáudio. É: “se isto, isto e isto mudasse, então eu
seria feliz”. Se não amo um ser humano com tudo aquilo que faz dele único e especial,
como posso falar de amor? É precisamente naquilo que nos distingue de todo e
qualquer outro ser deste mundo que reside o amor. Nos pequenos detalhes,
naquilo que frequentemente nem sequer se define ou explica, naquilo que é bom e
particularmente naquilo que é menos bom. É amar o “pacote” inteiro. É o amar,
muitas vezes, “apesar de”.
Se
esse meu olhar de encanto, que distingue uma pessoa de milhões de outras
pessoas, será ou não correspondido na mesma direcção e medida, isso é uma outra
história. Porque para além de toda esta triagem de afectos, é ainda preciso
encontrar do outro lado alguém que não esteja igualmente confundido e que não nos
enrede em mais uma ilusão, chamando também amor a outra coisa qualquer muito
parecida (jurando-o com pensamentos, palavras, actos e omissões).
Entretanto,
em jeito de rodapé, se não der para desatar o nó da confusão, é melhor andar
confundido do que não sentir absolutamente nada e não nos ligarmos a ninguém. Somos
seres relacionais e, assim sendo, pior do que uma relação assente em confusão
será deixar de acreditar/investir no amor e nas pessoas.
Adorei!
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