Quando
pressentimos que dentro de nós existe um buraco temos medo de cair nele. Chamemos-lhe
“o lado depressivo da personalidade”, um lugar escuro e triste, que nem sempre
conseguimos justificar logicamente mas que nos suga a energia e nos deixa num
estado de espírito terrível, por vezes até incapazes de reagir, de viver. O
medo da depressão existe em todos nós, desde que em algum momento conhecemos de
perto estados de desânimo profundo e conseguimos fantasiar o que será viver
nesse lugar.
O
medo da depressão (ou dos estados mais depressivos) leva-nos tantas vezes a uma
fuga para a frente: viajando, trabalhando ou exercitando o corpo de forma compulsiva,
ou de forma mais perigosa, pelo abuso de substâncias (drogas, álcool),
sexualidade exacerbada, compulsão alimentar, etc. Esses caminhos por onde o
medo nos conduz não representam necessariamente escolhas conscientes, ou seja,
é quase automático este gesto de evitamento da dor interna e consequente busca
do prazer, ainda que efémero ou ilusório. O medo da depressão é o medo de um
buraco sem fundo. Mas fugir, evitar, ou negar esse buraco é mais prejudicial do
que cair nele, e mesmo batendo de rabo no chão (pois ele tem, sim, fundo)
explorá-lo e encontrar maneira de sair ou de viver com ele.
Fugimos
da depressão, dor da perda, quando, por exemplo, depois de um divórcio nos
negamos a chorar ou a encontrar-nos a sós com a nossa solidão e entramos imediatamente
numa nova relação. Fugimos tantas vezes quando nos morre alguém chegado; a dor
é funda e temos medo, não queremos senti-la. Fugimos quando não conseguimos
estar parados ou sozinhos, evitando ficar a sós com a nossa cabeça. Os casos
serão infinitos mas não é preciso um evento externo ou uma causa lógica para
sentirmos a presença silenciosa de um qualquer sofrimento. Talvez o maior medo
surja mesmo das dores cujas origens não identificamos; daquele sofrimento ou
insatisfação permanente que nem entendemos bem de onde vem mas que está lá, à
espera que olhemos para ele. Fugimos dessa dor desconhecida, cujas raízes são,
frequentemente, antigas e profundas, vivendo refugiados em estratégias que nos
permitem andar para a frente, mas sem a coragem de querer perceber o que é isso
que nos come por dentro.
Porém,
as emoções mais difíceis estão à espreita, e querendo nós olhar ou não para
elas, elas olharão para nós. Fitam-nos, particularmente nas horas mais escuras,
e talvez seja necessário olhar para elas de frente, e perguntar-lhes “quem és
tu e o que queres de mim?”. O conhecimento pode ser assustador, mas o
desconhecido é mais. O conhecimento é um processo muito poderoso, porque o medo
da dor é sempre pior que a dor em si. O medo vive da imaginação e não tem fim;
a dor vive do real e quanto mais intimamente a conhecermos, melhor viveremos
com ela, ou apesar dela.
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