Era uma vez. E depois foram felizes para sempre. É o começo
e o fim de quase todos os contos infantis que povoam o imaginário das crianças.
É inquestionável a importância dos contos de fadas: ajudam-nos a imaginar, a
sonhar e a desejar. Ensinam-nos sobre o amor e sobre a amizade. Sobre os afectos.
Sobre os valores. Ensinam-nos sobre a coragem e sobre a derrota e a vitória. São
fundamentais, os contos de fadas. Mas o final é sempre feliz e nunca nenhum
conto nos conta o que acontece depois do “felizes para sempre”. E se quando
somos pequenos, acreditar nos desfechos felizes é o que nos permite andar para
a frente, crescer é deixar cair a ilusão de que o fim das histórias é incondicionalmente
feliz. Sem mais sobressaltos. Sem mais tropeções. As histórias são felizes
enquanto puderem ser. Ora são mais felizes, ora são menos felizes, ora tornam a
ser mais felizes. Crescer é encarar uma realidade que não é eternamente nem
estaticamente cor-de-rosa mas podendo aceitar que há muitos outros tons que
pintam as histórias das nossas vidas. São tons vermelhos, azuis, verdes,
amarelos. Também há os cinzentos e mesmo os pretos. É, a realidade não é um
conto de fadas. Mas é uma pintura colorida ainda mais interessante e saborosa do
que um conto de fadas. São contos de gente.
“Muitos adultos ficam
chocados com a violência dos contos de fadas e se surpreendem com o facto de
que não a percebiam quando eram crianças, comprazendo-se nela. É que a maioria
das crianças, além de aceitar naturalmente o maravilhoso, espera com inabalável
certeza aquilo que o conto promete e sempre cumpre: "e foram felizes para
sempre". A gente se engana, portanto, quando tenta "açucarar" os
contos ou omitir as passagens "violentas".”
Marilena Chauí
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