O narcísico,
como o autista e o psicótico – não fossem todos eles egocêntricos –, julgando ver o mundo, não vê senão
a sua barriga. Para ele, o centro do mundo é o próprio umbigo; pelos outros
não se interessa minimamente, não o preocupam nem o ocupam, é como se não
existissem – a não ser na medida em que lhe possam ser úteis (o seu investimento objectal é apenas
funcional ou instrumental – o outro é usado como um instrumento, para realizar
uma função de que não dispõe ou é débil). Centra-se em si mesmo, gravita à
volta da sua nulidade, pensando – talvez – que com isso pode acender o pavio da
sua humanidade extinta. Sim, porque a humanidade gera-se no interesse pelos
outros humanos; de contrário, não existe: apaga-se ou não chega a nascer.
Mas quem disse “nascer” e “existir”? Responde-se: nasce-se no “útero mental” do objecto, no pensamento
e no afecto de quem nos deseja, ama e sonha, de quem gosta e aposta em nós;
vive-se, existe-se, se
esse investimento em nós persiste.
A tragédia da desordem mental, seja
ela a doença com sintomas ou a perturbação da personalidade com traços patológicos,
é esta: a falta ou a perda desse “ninho da alma”, dessa “Terra Prometida”.
António
Coimbra de Matos (in reflexão “Princípio e Continuação”)
Sem comentários:
Enviar um comentário