Escutar
e ouvir são coisas diferentes, de diferente natureza e profundidade. Por ouvir
entende-se a capacidade de perceber através do sentido da audição. Não se
aprende, é uma capacidade inata que pode ser encarada como uma função mecânica na
condição humana (e animal). Escutar, por sua vez, é um ouvir de outra
qualidade. Requer ouvir com atenção. Quem escuta, ouve, mas nem sempre quem
ouve, escuta. Escutar é uma capacidade esquecida.
Embora reconheçamos a importância de
prestar atenção ao que as pessoas nos dizem, de um modo geral, somos maus
ouvintes e falhamos redondamente nesta questão tão importante em qualquer
relação humana. Hoje, em pleno apogeu do individualismo, falta sempre
disponibilidade (de tempo ou vontade) e então não escutamos. Quando perdemos a
paciência, quando interrompemos o interlocutor ou atropelamos o que nos diz com
julgamentos inoportunos ou críticas. Não escutamos quando deixamos de prestar
atenção e passamos a pensar em nós mesmos ou em outra coisa qualquer. Também não
escutamos quando bloqueamos a nossa atenção com sentimentos negativos. Nem
escutamos quando sonhamos acordados enquanto alguém fala.
Há muitos motivos para não ouvir mas, essencialmente,
não somos capazes de escutar se estivermos nós próprios, também, a precisar de ser
ouvidos. Para se escutar alguém é necessário estar mentalmente (logo,
emocionalmente) disponível para isso. A escuta é uma arte que requer
descentração de nós próprios. Se estamos focados nos nossos pensamentos ou sentimentos,
dificilmente podemos oferecer o tempo de antena necessário ao nosso interlocutor.
Claro que seria
impossível escutar activamente uns e outros, com inteira atenção, a todo o
momento. É que também precisamos de tempo para ficarmos entregues ao que nos
vai cá dentro.
Nas
relações humanas, muitos não se sentem escutados. E ninguém gosta de “falar
para as paredes”. Escutar é a
mais crítica das habilidades de comunicação e talvez a mais importante para haver
bem-estar entre as pessoas. Sermos ouvidos com genuína atenção dá-nos a
percepção de que importamos. Seja para partilhar uma dor, uma alegria ou um
anseio. Seja para emitir uma opinião ou para pedir um conselho. Ter uma voz e
vê-la reconhecida e considerada é fundamental. Permite-nos sentir amparados e
compreendidos. A expressão “Tá ligado?” é utilizada pelo povo brasileiro para
questionar o interlocutor sobre se este entendeu o que foi comunicado. De
facto, quando escutamos, estamos ligados ao outro. Estamos em relação com
alguém. Se não nos ligarmos, não poderemos escutar. Poderemos, quando muito,
ouvir. E, no final, rematar, “hum?”
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