sexta-feira, 25 de maio de 2012

O relógio avariado


O relógio da cozinha continua parado e avariado há mais de um ano. Quantas vezes pensei que bastaria pôr-me em cima de um banco, pegar nele e atirá-lo para o lixo? Mas nunca o fiz. Nunca o fiz porque aquele relógio sou eu. Ele precisa de estar assim, porque algumas coisas precisam de denunciar o que se passa dentro de nós. Não é a preguiça que me impede de o deitar fora, é a verdade. E a verdade é que o tempo está parado dentro de mim. A minha casa sou eu. Está parada. Quando eu começar a funcionar, vai aparecer um relógio a funcionar.

Marta Gautier

domingo, 20 de maio de 2012

Domingar



O Domingo comporta uma certa preguiça, um laissez-faire profundamente gostoso. Para quem não consegue desacelerar, o Domingo torna-se um fardo. Convida a estar, a sentir, logo, a pensar. Mas Deus descansou ao Domingo e nós também. Desaceleremos. Estejamos. Sintamos. Pensemos. Para que se comece a semana de barriga cheia, entreguemo-nos à contemplação, ao ronronar dos afectos e às brincadeiras alegres das famílias!

Excelência do Pensamento



António Coimbra de Matos foi galardoado com o prémio - Distinguished Psychoanalytic Educator Award 2012 - prémio com que o IFPE  (The International Forum for Psychoanalytic Education) distingue anualmente uma “Personalidade de Mérito” associada à excelência do ensino da Psicanálise. 
Este prémio será entregue na IFPE’s 23rd Annual Interdisciplinary Conference, Theme: Sustainable Psychoanalysis: Embracing Our Future, Preserving Our Past, em Novembro 2-4, 2012, The Governor Hotel , Portland, Oregon.
António Coimbra de Matos é um dos fundadores da Associação Portuguesa de Psicanálise e Psicoterapia Psicanalítica. A AP está inscrita na IFPE desde o ano de 2009 e alguns associados têm-na representado anualmente nesta conferência.
Parabéns, Professor !

domingo, 6 de maio de 2012

Sigmund Freud (156 anos)



Dia da Mãe, mas também dia de um Pai. Comemora-se hoje o 156º aniversário do nascimento de Sigmund Freud, o "Pai" da Psicanálise. Homenageamo-lo, também, por "dar à luz" a teoria mais completa para a compreensão do funcionamento mental no Homo Sapiens Sapiens (o Homem que sabe que sabe). Tanto sabe que usa (inconscientemente) as melhores manobras de ilusão na arte de se enganar a si mesmo.
Freud mostrou-nos as "trevas" que carregamos dentro de nós mas ofereceu-nos as técnicas que nos conduzem à "luz". Hoje, a Psicanálise continua a ser uma viagem fabulosa que nos oferece o conhecimento, a verdade e a liberdade. Para os que têm coragem de dobrar o Cabo das Tormentas e enfrentar os seus Adamastores, grandes Glórias no Horizonte!

Mãe



"Mãe não tem limite,
é tempo sem hora,
luz que não apaga"

Foi muita confusão mesmo, mas senti um bem-estar interior em ver a loja repleta de pessoas e ver a sua alegria a fazer compras, comprar coisas que muitas pessoas não podiam num dia normal sem descontos. Bolachas, bacalhau, carne etc..
Aqui fica um exemplo do que o Grupo Jerónimo Martins deu aos clientes e muitos devem ter entrado a primeira vez ontem, mas talvez voltem e abram os olhos.

Agora imaginem o que dão aos empregados, pois somos nós que damos os lucros a empresa e reconhecem isso. Quantas fazem isso? Nem o governo reconhece.

2 De Maio de 2012
Carlos Drummond de Andrade

sábado, 5 de maio de 2012

Sonho meu



Falar de sonhos não é simples. Sonhar faz parte de uma função psíquica fundamental do ser humano, a função simbólica. Assim sendo, para compreender o que representam os sonhos, é preciso perceber, primeiro, o conceito de símbolo.
Um símbolo, elemento essencial na comunicação e pensamento humanos, é um termo, um nome ou uma imagem que nos pode ser familiar, mas que possui uma conotação especial para além do seu significado evidente. Assim, uma palavra/imagem é simbólica quando implica algo mais do que o seu significado manifesto e imediato.
A nossa mente trabalha com símbolos no seu quotidiano. Mas este uso consciente que fazemos dos símbolos é apenas um detalhe óbvio que remete para um facto psicológico menos conhecido: o homem também produz, ele próprio, os seus símbolos, inconsciente e espontaneamente, sob a forma de sonhos.
Há acontecimentos (vivências com pensamentos, afectos e emoções associados) na nossa vida de que não tomamos consciência. Ficam “guardados” abaixo do limiar da consciência. E, apesar de os termos ignorado (mesmo sem saber que os ignoramos), mais tarde brotam do inconsciente, de forma camuflada: por exemplo, sob a forma de um sonho. Saiba-se que um sonho raramente representa aquilo que nos parece. Por isso são, tantas vezes, desprovidos de lógica ou nexo. Para além do sentido manifesto (evidente) do sonho, possui um poderoso sentido latente (simbólico, escondido, mascarado), dificilmente acessível sem um conhecimento muito profundo de nós próprios.
Do ponto de vista histórico, foi o estudo dos sonhos que permitiu, em grande parte, aos psicólogos, a investigação do lado inconsciente do funcionamento e comportamento humano. De facto, por serem produzidos de forma inconsciente, raramente o indivíduo percebe o que simbolizam, na verdade, os elementos do sonho. Os livros de interpretação de sonhos pouco ajudam, pois todo o sonho merece uma análise global e contextualizada, não podendo ser analisado “às fatias” ou de forma standardizada.
Os sonhos são um mundo intrigante para a maioria das pessoas. Sabemos que apenas conhecemos uma ínfima parte do que se passa dentro de nós. O “resto” fica bem lá no fundo e, muitas vezes, só um processo de psicanálise ou psicoterapia psicanalítica pode trazer à consciência aquilo que, sozinhos, não compreendemos (ou que “escondemos” de nós próprios). Relembrando o que disse Carl Jung em O Homem e os seus Símbolos (1987), “aquele que nega a existência do inconsciente está, de facto, a admitir que, hoje em dia, temos um conhecimento total da psique. É uma suposição evidentemente tão falsa quanto a pretensão de que sabemos tudo a respeito do universo físico. A nossa psique faz parte da natureza e o seu enigma é, igualmente, sem limites.”

quinta-feira, 3 de maio de 2012

Caricaturando

Crash


It's the sense of touch. In any real city, you walk, you know? You brush past people, people bump into you. In L.A., nobody touches you. We're always behind this metal and glass. I think we miss that touch so much, that we crash into each other, just so we can feel something.

Crash (vencedor do Oscar para o Melhor Filme em 2006)

Cheios de coisa nenhuma



"Nas ruas cheias de gente/ vi as pessoas desertas"

Manuel Alegre

quinta-feira, 26 de abril de 2012

Na companhia da solidão



Fala-se de solidão. Ela já foi cantada, declamada e narrada por um sem fim de artistas mas, fundamentalmente, é sentida e vivida em algum momento por nós, seres pensantes (e relacionais). Pode durar esse exacto momento, mas pode, também, durar uma vida inteira. Embora a noção de solidão tenha existido desde sempre (como condição intrínseca do ser humano), considera-se que há também uma vertente social que tem lugar neste “debate”. Assim, para compreender melhor a solidão, parece indispensável uma articulação entre a dimensão psicológica e essa dimensão social do conceito.

Entende-se que um dos rostos da modernidade é a valorização da autonomia individual. Ser auto-suficiente, ser independente, ser livre, são ideais que, na ausência de equilíbrio, conduziram à exacerbação do individualismo. Já na obra “A Cultura do Narcisismo” (1983), Christopher Lasch falou do modo como as sociedades capitalistas se estruturaram, material e simbolicamente, segunda essa preocupação intensa com a realização individual (estreitamente relacionada com o universo do consumo), em detrimento dos ideais colectivos. Ocorreu, gradualmente, uma centralização no Eu e um desinvestimento nas relações com os outros. Como dado significativo, recordemos que, consoante os países (do primeiro mundo), há estatísticas que situam entre os 25% e os 40% a percentagem de indivíduos que moram sozinhos.

Na verdade, muitos ainda não desistiram de tentar incluir no seu projecto de vida as ligações aos outros, mas vêem-se confrontados com relações interpessoais difíceis e complexas, sentindo-se frequentemente tentados/obrigados a recuar. Evidentemente, se inseridos numa sociedade esquecida de comportamentos de tolerância, que desvalorizou os afectos e as relações humanas, os indivíduos vivem em conflito permanente com o outro. E aí, acontece que o ser humano se sente de novo só, embora acompanhado. Fica uma pergunta: o “mal” estará realmente no outro, ou seremos todos nós também um produto da modernidade, acolhendo já inconscientemente essa incapacidade?

Sozinhos e sós, ou acompanhados e sós, são solidões distintas, que muitas vezes se fundem numa só, esmagadora. Se a solidão representa o sentimento quotidiano da nossa vida, talvez ajude verdadeiramente perceber, com ajuda técnica, qual a origem desse sentimento dentro de nós. E, em tempos de crise, talvez possamos recordar, por fim, que o afecto e as ligações humanas serão sempre os melhores ingredientes da felicidade.

segunda-feira, 23 de abril de 2012

Mãos ao Trabalho!


“O desespero nunca serviu as sociedades democráticas e é preciso ter em conta os sonhos das pessoas, que se podem tornar em pesadelos. Os psicólogos têm um papel fundamental para lidar com as incertezas e ajudar os portugueses.”

Telmo Baptista

Bastonário da Ordem dos Psicólogos Portugueses - Sessão de Abertura do I Congresso Nacional da OPP (18,19,20 e 21 de Abril de 2012)

quinta-feira, 12 de abril de 2012

quinta-feira, 5 de abril de 2012

O perfil da perversão


O que define uma perversão (ou parafilia)? Clinicamente, o que é um indivíduo perverso? Uma perversão pode ser entendida como uma perturbação crónica do comportamento sexual, em que a expressão de uma “pulsão perversa”, de natureza agressiva, é condição necessária para que o sujeito atinja a excitação sexual e o orgasmo. De outra forma, não sente qualquer prazer, pois o prazer não está ligado aos afectos, às relações humanas ou à intimidade. Podemos talvez dizer que, no mundo interno do sujeito, a sexualidade e a agressividade estão “confundidas”, estando essas experiências sexuais muito aquém daquilo que é verdadeiramente uma sexualidade adulta.

Uma das características básicas do perverso é a ausência de consideração pelo outro, este só serve ao perverso para descarga (sexual e agressiva). Esta instrumentalização/desumanização do outro implica não tomar em conta a sua vontade e o seu desejo; aliás, quanto mais o perverso desvia o outro das suas práticas habituais, mais gratificante se torna o acto. Assim, a sexualidade é um acto solitário, maioritariamente masturbatório, já que, incapaz de vivenciar a intimidade, não existe a ligação ao outro.

Verifica-se com frequência que, na história do perverso, entre mãe e criança o vínculo foi agressivo, e não de amor. Diz-se que a perversão é a patologia do ódio, porque o vínculo com o objecto primário é um vínculo de ódio. Para Stoller, a perversão é uma forma erótica de ódio, em que o meio utilizado para descarregar esse ódio é a humilhação e agressão do outro (representando esses comportamentos o ódio inconsciente ao objecto materno). Para além disto, há no perverso uma ferida narcísica (ou seja, inconscientemente, o sujeito não se ama a si mesmo, sentindo-se inferior) fundamental para a compreensão desta patologia. Tendo por base um vínculo de ódio, a relação básica entre mãe e filho falhou e este foi maciçamente desnarcisado – foi rejeitado/mal-amado. Essa desvalorização primária a que foi exposto faz com que o perverso, enquanto adulto, humilhe o outro, vingando-se pelo ataque como forma de reconstruir o seu próprio narcisismo.

Há várias manifestações de perversões, sendo as mais faladas, o sado-masoquismo, o exibicionismo, o fetichismo, o voyerismo e os abusos sexuais (incluindo a pedofilia). Contudo, qualquer comportamento sentido como um desvio sexual, poderá (ou não) ser uma perversão, dependendo da situação. Importa dizer que, para se estabelecer o conceito do que é um desvio, é preciso uma fundamentação a respeito da normalidade. O que distingue, na prática, uma sexualidade “normal” de uma sexualidade perturbada? Pergunta difícil, pois as considerações de normalidade e convencionalidade são afectas ao tempo e aos costumes. Contudo, sabemos que há limites intemporais à nossa expressão sexual, nomeadamente, o dever de respeitar a vontade e a liberdade do próximo.


quarta-feira, 28 de março de 2012

Pedrinha (Do que mais se quer)

“And did you get what you wanted from this life, even so?
I did.
And what did you want?
To call myself beloved, to feel myself beloved on the Earth.”

Raymond Carver (Collected Poems)

domingo, 25 de março de 2012

Sabedoria Centenária



Meus amigos do "Pasquim", outro dia, me perguntaram: "Oscar, e a vida?" Eu disse: "A vida é mulher do lado e seja o que Deus quiser".

Oscar Niemeyer (104 anos)