Transformação é a palavra-chave. Na vida ou há desenvolvimento ou instala-se a decadência. O estacionamento é uma ilusão. Nas palavras de Cervantes, “A estrada é sempre melhor que a estalagem” (António Coimbra de Matos)
domingo, 23 de dezembro de 2012
quinta-feira, 13 de dezembro de 2012
O misterioso e maravilhoso mundo inconsciente
Este ano, no Dia da Mãe, comemorou-se também o dia de
um Pai. Celebrou-se o 156º aniversário do nascimento de Sigmund Freud. Ele, que "deu à luz" a teoria mais
completa para a compreensão do funcionamento mental no Homo Sapiens Sapiens (o Homem que sabe que sabe), a Psicanálise.
Tanto sabe, que usa (inconscientemente) as melhores manobras de ilusão na arte
de se enganar a si mesmo, quando não quer ou não suporta saber.
Cá dentro, possuímos processos conscientes, que
percebemos relativamente bem e dos quais damos conta, mas ao mesmo tempo, muito
daquilo que somos remete para dados vivenciais aos quais não temos acesso. A
descoberta da existência do Inconsciente foi um legado imprescindível que
Sigmund Freud nos deixou, permitindo-nos hoje perceber que há mecanismos
psicológicos complexos por detrás dos nossos pensamentos, afectos e
comportamentos.
Porque não acedemos a esse inconsciente? Porque não
podemos (senão não seria inconsciente!). O que fica inconsciente é precisamente
aquilo que não somos capazes de pensar. Para nos ajudar com estas histórias
escondidas, construímos mecanismos de defesa, todos eles inconscientes, para ajudar
(ou não) a lidar com as dificuldades que se vão sentindo ao longo do
desenvolvimento. Temos defesas para evitar, recalcar, deslocar ou projectar afectos
e pensamentos para outro sítio qualquer bem longe da consciência. Sobre estes
mecanismos de defesa, pode dizer-se que uns são mais saudáveis que outros. Pode
dizer-se também, que a capacidade de suportar e pensar o sofrimento é
fundamental para um crescimento mental e afectivo estruturado, mas frequentemente
essas defesas instalam-se maciçamente, desorganizando e prejudicando o nosso
funcionamento e personalidade. Freud mostrou-nos as "trevas" que
carregamos dentro de nós mas ofereceu-nos as técnicas que nos conduzem à
"luz", trazendo à consciência aquilo que precisa de ser pensado e
compreendido. Hoje, a Psicanálise continua a ser uma viagem fabulosa que nos
oferece o conhecimento, a verdade e a liberdade.
Actualmente,
tem como “filhas” as psicoterapias de orientação psicanalítica, que invés de
usarem o clássico divã para deitar os seus pacientes, trabalham face-a-face.
Contudo, em ambas, o acesso aos fenómenos inconscientes permite descobrir a
chave de mistérios fantásticos do ser humano. Para descobrir isto, temos que
ter a força e a coragem de olhar a nossa história, pela mão de uma relação
sanígena (relação que cura). Para os que têm coragem de dobrar o Cabo das
Tormentas e enfrentar os seus Adamastores, grandes Glórias no Horizonte!
(29/05/2012)
sexta-feira, 7 de dezembro de 2012
Fugindo dos Pensamentos
Arthur Hughes |
Ser a moça mais linda do povoado.
Pisar, sempre contente, o mesmo trilho,
Ver descer sobre o ninho aconchegado
A bênção do Senhor em cada filho.
Um vestido de chita bem lavado,
Cheirando a alfazema e a tomilho...
- Com o luar matar a sede ao gado,
Dar às pombas o sol num grão de milho...
Ser pura como a água da cisterna,
Ter confiança numa vida eterna
Quando descer à "terra da verdade"...
Deus, dai-me esta calma, esta pobreza!
Dou por elas meu trono de Princesa,
E todos os meus Reinos de Ansiedade.
Pisar, sempre contente, o mesmo trilho,
Ver descer sobre o ninho aconchegado
A bênção do Senhor em cada filho.
Um vestido de chita bem lavado,
Cheirando a alfazema e a tomilho...
- Com o luar matar a sede ao gado,
Dar às pombas o sol num grão de milho...
Ser pura como a água da cisterna,
Ter confiança numa vida eterna
Quando descer à "terra da verdade"...
Deus, dai-me esta calma, esta pobreza!
Dou por elas meu trono de Princesa,
E todos os meus Reinos de Ansiedade.
Florbela Espanca (Rústica)
terça-feira, 27 de novembro de 2012
O poder do amor
"When the power of love overcomes the love of power the world will know peace"
Happy Birthday Jimi Hendrix!
Happy Birthday Jimi Hendrix!
sábado, 24 de novembro de 2012
sexta-feira, 23 de novembro de 2012
quinta-feira, 22 de novembro de 2012
Umbigos
O narcísico,
como o autista e o psicótico – não fossem todos eles egocêntricos –, julgando ver o mundo, não vê senão
a sua barriga. Para ele, o centro do mundo é o próprio umbigo; pelos outros
não se interessa minimamente, não o preocupam nem o ocupam, é como se não
existissem – a não ser na medida em que lhe possam ser úteis (o seu investimento objectal é apenas
funcional ou instrumental – o outro é usado como um instrumento, para realizar
uma função de que não dispõe ou é débil). Centra-se em si mesmo, gravita à
volta da sua nulidade, pensando – talvez – que com isso pode acender o pavio da
sua humanidade extinta. Sim, porque a humanidade gera-se no interesse pelos
outros humanos; de contrário, não existe: apaga-se ou não chega a nascer.
Mas quem disse “nascer” e “existir”? Responde-se: nasce-se no “útero mental” do objecto, no pensamento
e no afecto de quem nos deseja, ama e sonha, de quem gosta e aposta em nós;
vive-se, existe-se, se
esse investimento em nós persiste.
A tragédia da desordem mental, seja
ela a doença com sintomas ou a perturbação da personalidade com traços patológicos,
é esta: a falta ou a perda desse “ninho da alma”, dessa “Terra Prometida”.
António
Coimbra de Matos (in reflexão “Princípio e Continuação”)
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segunda-feira, 19 de novembro de 2012
sexta-feira, 16 de novembro de 2012
Dentro e Fora
Fui muito feliz em alguns dias de chuva. É que quando faz sol
cá dentro até podem cair pedras. O tempo de fora não conta quando é Verão
dentro de nós. Quando o cinzento de fora espelha o cinzento de dentro é que se
torna mais difícil não ir na onda. É um bocadinho como a crise. Quando a crise
lá fora espelha as crises cá de dentro tudo parece ainda mais negro. Há muita
gente aí aos berros e às pedradas. Cá para mim há muita gente aos berros e às
pedradas mas nem sabem bem que crise é que as oprime. Se a de fora se a de
dentro. Sem querer negar a realidade do tempo ou da economia quero poder ser
feliz em dias de chuva e quero poder ser feliz em dias de crise. Era bom que
para além de olhar pela janela olhássemos um pouco mais para dentro da nossa
‘casa’. Pode precisar de alguma arrumação, limpeza ou transformação. Ou
aquecimento. Há muitas ‘casas’ demasiado geladas!
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quarta-feira, 14 de novembro de 2012
Tecnologicamente Acompanhados
Ao
mesmo tempo que todos reconhecemos as maravilhas da evolução tecnológica,
sabemos também que nem sempre estes recursos são utilizados da melhor forma. Assim,
surgiu há pouco tempo o termo “nomofobia”, uma palavra
que resulta da contracção da expressão inglesa “no mobile phobia”. Refere-se ao medo de ficar impossibilitado de
aceder ao telemóvel. Também se aplica ao medo de ficar desconectado das redes
sociais (pelo menos até alguém inventar um qualquer nome específico também para
isso). Com a proliferação dos smartphones,
podemos dizer que uma coisa e a outra (telemóvel e redes sociais) estão cada
vez mais relacionadas. Dizem os dados de um estudo efectuado em Fevereiro, no
Reino Unido, que 66% dos inquiridos diz-se "muito angustiado" com a
ideia de perder o seu telemóvel. A proporção chega a 76% nos jovens entre os
18-24 anos, segundo um outro estudo. Cerca de 40% dos indivíduos consultados
afirmaram possuir mais de um aparelho.
Posto isto, que ninguém se assuste ou despreze a tecnologia com
receio de “apanhar” uma fobia, visto que elas não se pegam nem se reproduzem. Esta
“nova fobia” é apenas um nome para mais uma manifestação de ansiedade, manifestações,
estas, que se transformam em função dos tempos e das realidades. Sempre houve
medo, ansiedade e pânico, o que muda é o meio que nos envolve a forma como,
consequentemente, manifestamos essas emoções.
Este receio de ficar desligado da tecnologia permite uma análise
mais adequada e profunda, já que ele representa, sobretudo, a incapacidade de
estar só. Como se, ao “desligar” o telemóvel ou o computador, corressemos o
risco de, também nós, nos desligarmos dos outros e, os outros, de nós. Certo é
que só dependemos de estar insistentemente ligados aos outros se precisarmos
deles para não nos sentirmos sós e/ou quando não confiamos o suficiente nas
relações e nos afectos que nos rodeiam, exigindo um contacto sistemático que
afaste os nossos medos.
Quando sozinhos consigo próprios, muitos se sentem invadidos por
um vazio insuportável. Ou, ainda, invadidos por pensamentos que, pelo menos ao
falar com alguém, se vão dissipando com mais facilidade. Uma companhia é, sem
dúvida, um forte distractor. E, aqui, entra a tecnologia: o telemóvel e as
redes sociais vieram facilitar, indubitavelmente, a comunicação entre as
pessoas. Deixou de ser preciso esperar muito para falar com alguém, as pessoas
vivem à distância de uma chamada ou de um click. Permanece a questão mais
importante de todas: Estamos a usar estas facilidades de comunicação e ligação
de forma saudável, ou antes como um remédio fácil que mascara a incapacidade de
estar só por um segundo que seja?
sábado, 10 de novembro de 2012
Pedrinha (Sobre a Psicanálise?)
"We work in the dark — we do what we can — we
give what we have. Our doubt is our passion and our passion is our task. The
rest is the madness of art."
Henry James
terça-feira, 6 de novembro de 2012
Pedrinha (Da impulsividade)
O adolescente não pensa
antes, pensa depois.
Manuel Matos (in Adolescência – Representação e Psicanálise)
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segunda-feira, 5 de novembro de 2012
Pedrinha (Das Crianças-Heróis)
Quanto heroísmo não é necessário para vencer e ultrapassar os
monstros que povoam a imaginação infantil desde a mais precoce idade da razão!
Quanto heroísmo para vencer as injustiças do meio familiar e social! Quanta
coragem para que uma criança tenha de se insensibilizar a situações que
ultrapassam o seu poder real! Quanta força interior é necessária para a criança
se construir a si própria como pessoa, perante a indiferença e o abandono dos
maiores!
João dos Santos
quinta-feira, 25 de outubro de 2012
Todas as Palavras
As que procurei em vão,
principalmente as que estiveram
muito perto,
como uma respiração,
e não reconheci,
ou desistiram e
partiram para sempre,
deixando no poema uma espécie de
mágoa
como uma marca de água impresente;
as que (lembras-te?) não fui capaz
de dizer-te
nem foram capazes de dizer-me;
as que calei por serem muito cedo,
as que calei por serem muito tarde,
e agora, sem tempo, me ardem;
as que troquei por outras (como
poderei
esquecê-las desprendendo-se
longamente de mim?);
as que perdi, verbos e
substantivos de que
por um momento foi feito o mundo.
E também aquelas que ficaram,
por cansaço, por inércia, por acaso,
e com quem agora, como velhos
amantes sem
desejo, desfio memórias,
as minhas últimas palavras.
Manuel António Pina
Personalidade Borderline
Embora
ainda se use frequentemente a expressão “não é defeito, é feitio”, a verdade é
que hoje sabemos que a personalidade não justifica tudo e, muitas vezes,
estrutura-se mesmo com “defeito”. A personalidade também “adoece”. De facto,
muitas das pessoas que conhecemos com comportamentos pouco adequados, são como
são porque o seu processo de crescimento pessoal e social foi, de certa forma,
boicotado (mesmo quando o indivíduo não dá por isso, conscientemente).
Dizemos
que um indivíduo sofre de uma perturbação da personalidade quando se encontra
um padrão estável (global e inflexível) de afectos e comportamentos que se
afastam marcadamente do que seria esperado, originando sofrimento ou incapacidade
para o próprio. São normalmente diagnosticadas na adolescência ou na idade
adulta, pois só aí se considera que já existe uma identidade formada.
A
patologia borderline (ou patologia
limite da personalidade) é uma dessas perturbações de personalidade. O termo ainda
não está suficientemente divulgado mas é um tipo de organização mental que tem
vindo a aumentar, com maior incidência no sexo feminino. O número de pessoas
com este tipo de perturbação que procuram ajuda em psicoterapia é cada vez
maior, variando na gravidade dos sintomas mas apresentando como queixa
principal a incapacidade de funcionar adequadamente no dia-a-dia e um
sentimento de vazio interno.
Um indivíduo com uma
organização de personalidade borderline apresenta
transtornos em quase todas as áreas da sua vida, principalmente nas relações
interpessoais (relações com outras pessoas). Descrevendo estas personalidades
em traços largos, encontramos pouca profundidade nos sentimentos (dificuldade
em ligar-se ao outro e em manter relações íntimas), bem como uma tendência à
desconfiança e uma atitude social pouco agradável. Verificam-se, com elevada
frequência, comportamentos de risco, consumos de drogas e álcool e, também, alterações
no comportamento sexual. Há dificuldades no controle da vontade, no planeamento
dos objectivos de vida e incapacidade para o trabalho (ou
dificuldade em encontrar a profissão certa).
Assim, e resumidamente, os
sintomas mais comuns são a incapacidade de sentir, a angústia e desamparo, falta
de limites, desrespeito pelos outros, comportamento anti-social, depressão com
sentimentos de solidão e vazio, intolerância à frustração, comportamentos automutilantes
e pensamentos suicidas, incapacidade de sentir prazer, fobias, obsessões e
compulsões, dissociações e surtos psicóticos breves.
Estas personalidades assentam em falhas muito precoces
do desenvolvimento emocional. Implicam (e ao mesmo tempo expressam) um grande
sofrimento e um grande vazio interior. Nem sempre as pessoas querem ser como
são, simplesmente, não conseguem ser de outra maneira. Felizes os que
reconhecem que algo está errado e pedem ajuda.
quarta-feira, 10 de outubro de 2012
Pai = Lei
“É
no nome do pai que devemos reconhecer o suporte da função simbólica que, desde
a aurora dos tempos históricos, identifica sua pessoa à figura da lei.”
Jacques Lacan in Discurso de Roma – Escritos
domingo, 7 de outubro de 2012
sexta-feira, 5 de outubro de 2012
Pedrinha (Das Entrelinhas)
Mas já que se há-de escrever, que ao
menos não se esmaguem com palavras as entrelinhas.
quarta-feira, 26 de setembro de 2012
Educar a Escola
O
Homo Sapiens Sapiens é, precisamente,
não só aquele que sabe, mas, aquele que sabe
que sabe, e tendo consciência do seu saber, quer saber cada vez mais e
melhor. Por isso, a educação e a transmissão dos conhecimentos preocupam a
nossa espécie há milhares de anos.
Desde
a época de Sócrates, o filósofo, que a educação tem vindo a ser objecto de
interesse de estudiosos e curiosos. A primeira pedagogia, aplicada pelos
jesuítas, foi designada “método tradicional”. Era um método estruturado e
rigoroso, centrado no saber. Neste modelo educativo, quem detinha o conhecimento
era o mestre (o professor) e o aluno era encarado como aquele cuja função era (exclusivamente)
receber todo o conhecimento que o professor lhe transmitia. Assentava no
formalismo, na memorização e na autoridade, e os métodos de ensino
restringiam-se à exposição (da matéria) e à interrogação (questões sobre a
matéria, a “chamada”). Na sala de aula, o estrado acentuava a distância física e
afectiva entre professor e aluno, e as janelas eram colocadas acima do nível
dos olhos dos alunos, para não haver contacto com o exterior. E, durante muito
tempo, vigorou este acto educativo, fechado em si próprio.
Perante
o avanço do conhecimento acerca do desenvolvimento infantil (e do ser humano,
em geral), a pedagogia tradicional tornou-se desajustada e foram sendo gradualmente
introduzidas alterações no ensino, tanto estruturais como pedagógicas. Fundamentalmente,
o professor e o seu saber deixaram de ser o centro do processo educativo. Simbolicamente,
o estrado deixou de existir e as janelas foram abertas para o mundo exterior, permitindo
um grande enriquecimento humano pelas novas formas de interacção que então se
estabeleceram: mais diálogo entre aluno e professor, mais familiaridade entre
alunos, mais partilha entre todos. Cá fora, ao ar livre, os alunos passaram a
realizar actividades, visitas de estudo ou ginástica. Através da pesquisa, e de
uma forma autónoma, o aluno é agente e constrói também o seu conhecimento,
privilegiando sempre a actividade lúdica e o uso dos materiais didácticos.
Acrescenta-se a dimensão da liberdade e da disciplina desenvolvidas em conjunto,
como controlo e resultado uma da outra.
Já
percebemos que “educar não é domesticar”, como diz Eduardo Sá. Mas precisamos ainda
de um ensino que ouça todas as vozes, que fomente a criatividade e o pensamento
divergente, que legitime o direito à diferença e estimule a individualidade de
cada um, sem esquecer, evidentemente, a importância do todo em que nos
inserimos. E falta-nos, em grande parte, interiorizar que a escola não pode
resolver questões, outras, que ultrapassam o ensino. Quando as coisas não estão
bem na vida da criança, ela não consegue beneficiar do que a escola tem para
oferecer. A cabeça não pode funcionar na sala de aula quando o coração ficou em
casa. E os professores, sozinhos, não sabem nem podem resolver problemáticas
que os ultrapassam.
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O Brincar (Terapêutico e Desenvolutivo)
A
criança, portanto, ao criar uma distância através das personificações,
representa e maneja fantasmas que de outro modo seriam intoleráveis, domina
angústias e antecipa projectos, dá sentido e organiza o próprio mundo interior,
metaboliza e ordena os estímulos que lhe chegam do mundo exterior (e interior),
aprende a dominar fantasias e impulsos.
Antonino Ferro
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Pedrinha (Das infâncias sólidas)
“A
saúde mental constrói-se na infância. Os factores posteriores são menos
importantes. Uma criança teve perdas de afectos na infância, fez uma depressão
infantil que pode ter passado despercebida, estará mais fragilizada na idade
adulta e poderá deprimir facilmente. Se teve uma infância sólida aguentará bem
as perdas afectivas.”
António Coimbra de Matos
quarta-feira, 19 de setembro de 2012
Marylin, O Mais Belo Fantasma do Mundo
"Ninguém podia adivinhar que
se tratava de um fantasma. Ela era demasiado bonita para isso, demasiado doce, resplandecente.
Uma aparição não tem calor, é um lençol frio, um tecido, uma sombra
inquietante. Ela, ela encantava-nos. Devíamos ter desconfiado. Que poder tinha
ela para nos fascinar tanto, para nos impressionar e nos levar à nossa maior
felicidade? Deixamo-nos cair na armadilha a ponto de não compreendermos que já estava
morta havia muito tempo.
Na verdade, Marylin Monroe
não estava completamente morta, estava apenas um pouco, às vezes um pouco mais.
O seu charme, ao fazer nascer em nós um sentimento delicioso, impedia-nos de
compreender que não é necessário estar morto para não viver. Começara a não estar
viva desde que nascera. A sua mãe, desumanamente infeliz, expulsa da humanidade
por ter trazido ao mundo uma filha ilegítima, estava estupidificada de
infelicidade. Um bebé não se pode desenvolver de outra forma que não seja no
meio das leis inventadas pelos homens, e a pequena Norma Jean Baker, mesmo
antes de nascer, encontrava-se fora da lei. A melancolia que sentia preenchia
de tal forma o seu mundo que a mãe não teve força para lhe oferecer uns braços
tranquilizadores. Foi necessário colocar a futura Marylin em orfanatos gelados
e confiá-la a uma série de famílias de acolhimento entre as quais era difícil
aprender a amar.
As crianças sem família não têm
tanto valor como as outras. O facto de serem exploradas sexual ou socialmente não
pode ser considerado um crime grave, uma vez que estes pequenos seres
abandonados não são totalmente crianças verdadeiras. Algumas pessoas pensam
assim. Para sobreviver apesar das agressões, a pequena Marylin teve de começar
a “imaginar”, a alimentar-se da própria dor, antes de se afundar na melancolia
e na loucura da sua mãe. Então, declarou que Clark Gable era o seu verdadeiro pai,
e que pertencia a uma família real. Não tinha outra alternativa! Desta forma construía
uma identidade vaga, já que, sem sonhos loucos, teria sido forçada a viver num
mundo de lama. Quando a realidade morre, o delírio dá origem a uma maré de
felicidade. Assim, casou-se com um campeão de basebol para quem cozinhava todas
as noites cenouras e ervilhas , cujas cores tanto lhe agradavam.
Em Manhattan, onde tirou
cursos de teatro, passou a ser a aluna preferida de Lee Strasberg, que era
fascinado pelo seu estranho encanto. Já tinha estado morta muitas vezes. Era
necessário estimulá-la bastante para que não se deixasse levar para o mundo dos
mortos. Ela hibernava, não saia da cama e já não se lavava. Quando acordava com
um beijo, de Arthur Miller, por quem se tornou judia, de John Kennedy ou de
Yves Montand, reanimava-se, deslumbrante e afectuosa, e nenhum deles se
apercebia de que tinha sido encantado por um fantasma. No entanto, ela dizia-o
quando cantava I’m Through With Love. Estando
já afastada do mundo dos mortais, refulgente em plena glória, sabia que só lhe
restavam três anos de vida antes de oferecer a si própria um último presente: a
morte.
Marylin nunca esteve
completamente viva, mas nós não o podíamos saber, pois o seu fantasma era tão
maravilhoso que nos enfeitiçava."
Boris
Cyrulnik in O Murmúrio dos Fantasmas
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quinta-feira, 13 de setembro de 2012
Poesia
É fácil trocar as palavras,
Difícil é interpretar os silêncios!
É fácil caminhar lado a lado,
Difícil é saber como se encontrar!
É fácil beijar o rosto,
Difícil é chegar ao coração!
É fácil apertar as mãos,
Difícil é reter o calor!
É fácil sentir o amor,
Difícil é conter sua torrente!
Como é por dentro outra pessoa?
Quem é que o saberá sonhar?
A alma de outrem é outro universo
Com que não há comunicação possível,
Com que não há verdadeiro
entendimento.
Nada sabemos da alma
Senão da nossa;
As dos outros são olhares,
São gestos, são palavras,
Com a suposição
De qualquer semelhança no fundo.
Fernando Pessoa
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terça-feira, 11 de setembro de 2012
quinta-feira, 6 de setembro de 2012
Pedrinha (Dos medos paralisantes)
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quarta-feira, 5 de setembro de 2012
A função paterna
No princípio são três, mãe, pai e filho. O acto de conceber
um filho é da responsabilidade de dois indivíduos e parece que há uma boa razão
para que assim seja, fundamentalmente na espécie humana, a mais complexa de
todas. Embora hoje muitas crianças cresçam na realidade da monoparentalidade, a
investigação psicológica tem demonstrado, de há algumas décadas para cá, a
necessidade absoluta e presença insubstituível da figura paterna.
Como se sabe, o nosso equilíbrio emocional e bem-estar psicológico
estão completamente relacionados com a qualidade da relação primária, nome
atribuído à relação entre mãe e filho, que começa logo durante a gravidez. É
esta ligação primordial que nos dá as ferramentas internas para descobrirmos
quem somos e conduzirmos a nossa vida com entusiasmo, segurança e responsabilidade.
É nessa relação que ganhamos (ou não) o embalo para acreditar, projectar e
realizar, bem como para ultrapassar as dores e os dissabores que encontramos
pelo caminho.
Contudo, o pai junta-se à díade mãe-filho com uma função
igualmente importante para a estruturação psíquica da criança. De certa forma, inicialmente
o pai representa a primeira “frustração” introduzida na vida de uma criança: o
pai é aquele que “impede” que o filho tenha a mãe exclusivamente para si. Experiência
dolorosa, esta, mas necessária para um desenvolvimento saudável. Embora sem
essa intenção, um pai permite e prepara, assim, a separação e a autonomia da
criança, evitando uma fusão (que não é suposta) entre mãe e filho. Tem uma
função separadora mas, ao mesmo tempo, estruturante.
Não fica por aqui, a questão da função paterna. Tal como a
mãe, o pai desempenha, também, um importante papel nas interacções com o filho,
estimulando e atendendo às suas necessidades básicas (afecto, segurança,
alimentação, higiene, brincar e aprender). Alternando com a mãe nestes
cuidados, permite à criança conhecer, desde cedo, dois diferentes modelos de
relação, um com o pai e outro com a mãe. E nós, espécie inteligente, rapidamente
começamos a guardar connosco o melhor de cada um.
Depois, o pai enriquece a identidade de género dos seus
filhos, apresentando-se como modelo de admiração ao seu filho-homem e narcisa a
feminilidade da sua menina-mulher. Mais. Pai e mãe são o primeiro e mais
importante modelo de uma relação amorosa. É através das discórdias entre pai e
mãe (se acontecem com respeito e sem depreciação um do outro) que se enriquece
a mente da criança, oferecendo-lhe múltiplas perspectivas da realidade. Se o
casal lida bem com essas “discussões”, mostra à criança que com liberdade se
pode amar alguém que pode ser e pensar de forma diferente de nós.
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terça-feira, 28 de agosto de 2012
sábado, 25 de agosto de 2012
Pedrinha (Dos desejos intermináveis)
''Somos
seres desejantes destinados à incompletude e é isso que nos faz caminhar''
Jacques Lacan
sábado, 28 de julho de 2012
Pedrinha (Do mundo interno)
"Cada
pessoa transporta dentro de si um mundo feito de tudo o que viu e amou; e é
para este mundo que incessantemente retorna (...)”
Chateaubriand (in Voyage
en Italie)
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quinta-feira, 26 de julho de 2012
Contos de Gente
Era uma vez. E depois foram felizes para sempre. É o começo
e o fim de quase todos os contos infantis que povoam o imaginário das crianças.
É inquestionável a importância dos contos de fadas: ajudam-nos a imaginar, a
sonhar e a desejar. Ensinam-nos sobre o amor e sobre a amizade. Sobre os afectos.
Sobre os valores. Ensinam-nos sobre a coragem e sobre a derrota e a vitória. São
fundamentais, os contos de fadas. Mas o final é sempre feliz e nunca nenhum
conto nos conta o que acontece depois do “felizes para sempre”. E se quando
somos pequenos, acreditar nos desfechos felizes é o que nos permite andar para
a frente, crescer é deixar cair a ilusão de que o fim das histórias é incondicionalmente
feliz. Sem mais sobressaltos. Sem mais tropeções. As histórias são felizes
enquanto puderem ser. Ora são mais felizes, ora são menos felizes, ora tornam a
ser mais felizes. Crescer é encarar uma realidade que não é eternamente nem
estaticamente cor-de-rosa mas podendo aceitar que há muitos outros tons que
pintam as histórias das nossas vidas. São tons vermelhos, azuis, verdes,
amarelos. Também há os cinzentos e mesmo os pretos. É, a realidade não é um
conto de fadas. Mas é uma pintura colorida ainda mais interessante e saborosa do
que um conto de fadas. São contos de gente.
“Muitos adultos ficam
chocados com a violência dos contos de fadas e se surpreendem com o facto de
que não a percebiam quando eram crianças, comprazendo-se nela. É que a maioria
das crianças, além de aceitar naturalmente o maravilhoso, espera com inabalável
certeza aquilo que o conto promete e sempre cumpre: "e foram felizes para
sempre". A gente se engana, portanto, quando tenta "açucarar" os
contos ou omitir as passagens "violentas".”
Marilena Chauí
domingo, 22 de julho de 2012
quarta-feira, 18 de julho de 2012
Pedrinha (Das fronteiras necessárias)
“Os bons pais seriam auxiliadores da
separação clara entre fantasia e realidade. Nem sempre este equilíbrio é
conseguido e a confusão inicia-se, cresce, invade o Eu e surge a ruptura e o
sofrimento. Na geração de adultos-pais, falha a capacidade de se separarem dos
próprios filhos. O primeiro sintoma deste caos confusional é a abolição de
limites-fronteiras claras, entre a geração de pais e a geração de filhos. São
os banhos comuns, camas comuns, partilha obrigatória de segredos em todas as
direcções, etc. A criança entra em luta por uma sobrevivência e uma autonomia
enquanto lhe resta alguma energia disponível, mas se os benefícios narcísicos
persistem (“sou igual ao pai porque durmo com a mãe como ele”), a patologia
instala-se e pode estabilizar no negativo.”
Teresa Ferreira (in Em defesa da criança)
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Pedrinha (Dos amores das crianças)
"A capacidade ou incapacidade de amar tem
a sua génese na infância, embora a vivência de uma autêntica relação amorosa só
seja possível a partir da adolescência."
Teresa Ferreira (in Em defesa da criança)
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quinta-feira, 12 de julho de 2012
Pedrinha (Do conhecer, compreender e transformar)
"A psicanálise serve para aprofundar o
auto-conhecimento, e não só; também o conhecimento do outro (os outros) e,
sobretudo, das relações não só interpessoais mas essencialmente
intersubjectivas."
António
Coimbra de Matos
Nota: Estes conhecimentos, por si só, não
resumem a psicanálise nem a psicoterapia psicanalítica. Depois de conhecer, despontará o compreender. Estabelecer ligações entre o que é e o que foi. E, por fim, é preciso transformar. O que será. Passado, presente e futuro. Ligados. Descobrir, aceitar, compreender, integrar e transformar. Em busca do melhor que temos dentro de nós.
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O sentido da vida
Não
gostamos de falar sobre a morte. Nem sequer de pensar sobre a morte. Também não
parece muito confortável ler sobre a morte. Se calhar, depois de a palavra
morte surgir tantas vezes, sem eufemismos, muitos interromperão, já aqui, a sua
leitura. Quem ama a vida, sofre quando pensa na morte. E teme-a, dada a sua
inevitabilidade.
Ganhamos,
desde cedo, consciência do fim da vida. Essa consciência conduz-nos a um tipo
de angústia muito particular, a angústia
existencial, que embora surja logo na infância, se torna mais pensada
(logo, mais sentida) a partir da adolescência. À volta desta angústia nascem
questões que, com maior ou menor frequência, todos já colocámos: O que há
depois da morte? Qual o sentido da vida? Existe Deus? Será, a alma, imortal?
Como
lidamos nós com a certeza da nossa finitude?
Para
quem, através da fé religiosa, encontra as suas respostas para estas perguntas,
torna-se mais fácil viver sem grandes problemas existenciais. É uma forma de
dar um sentido à nossa existência e que nos garante o reencontro das almas
mesmo depois do adeus.
Para
quem estas perguntas ficam sem resposta, para os que não encontram aqui a
serenidade necessária, são adoptadas outras maneiras de seguir em frente
(sabendo que seguir em frente significa seguir em direcção à morte). Perante a angústia
existencial, encontramos um mecanismo de defesa psicológico chamado evitamento, que nos ajuda a “esconder”
de nós próprios os nossos maiores receios (e outras emoções). É útil, caso
contrário, estaríamos todos mais ocupados a questionar a fragilidade da vida do
que a vivê-la. Na sua vertente mais patológica, o mecanismo do evitamento pode assumir
a forma de delírio. Aí, quando a dificuldade
de pensar a morte se mascara de indiferença ou até de omnipotência, tendemos a “desafiá-la”
inconscientemente e, à custa disso, podemos encontrá-la mais cedo.
O
mecanismo de evitamento mais saudável é de outra qualidade, é a resignação/aceitação. A maioria de nós
apaga a consciência da morte enquanto se entretém com as tarefas da vida.
Percebemos que a melhor forma de não temer a morte é dar sentido à vida. É
aproveitá-la. É amar e ser amado, crescer, criar vínculos e/ou descendência,
produzir obra e deixar um legado. Temos a liberdade de escolher que sentido dar
à nossa vida, contudo, de tudo o que podemos escolher, que seja uma escolha de
amor. É pelo amor que melhor se ultrapassa a angústia existencial. Pelo
estabelecimento de relações significativas e criativas. O amor por nós e pelo
outro é o espelho do amor pela vida (que é, no fim de contas, feita da soma de
nós e dos outros).
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